quinta-feira, 14 de março de 2013

27. PECADO E JUSTIÇA (Parte I)

      P. A Bíblia está repleta de textos que falam do pecado original, e do pecado em sentido geral, a que todos os homens estão sujeitos. Muitos desses textos se encontram, por sinal, no Novo Testamento. Por que, então, mesmo dizendo-se cristão, o Espiritismo refuta a existência do pecado original e fala apenas de falhas e erros humanos, computando-os por compreensíveis, pela condição humana de espíritos ainda ignorantes, os quais são perdoados através de expiações, geralmente noutra encarnação, não reconhecendo a justiça implacável de Deus, do Inferno, e que todos somos pecadores desde que nascemos, segundo a Bíblia? Com isto, não pretende o Espiritismo adiar indefinidamente as consequências das nossas culpas, estimulando a ideia de impunidade e a repetição sistemática dos mesmos pecados, ou erros já cometidos?


      R. Antes de iniciar a resposta, propriamente dita, transcrevo alguns dos textos bíblicos que mencionam o pecado, a fim de por eles me guiar no que irei aqui dizer:

# "Portanto, como por um só homem entrou o pecado no mundo, e, pelo pecado, a morte, assim também a morte passou para todos os homens, porque todos pecaram" - Paulo (Romanos 5: 12).

# "Como insistissem, Jesus levantou-se e lhes disse: Aquele que dentre vós estiver sem pecado, seja o primeiro que lhe atire pedra" (João 8: 7) - refere-se ao episódio da mulher adúltera trazida até Sua presença pelos escribas e fariseus, para O testarem em relação à aplicação da Lei de Moisés.

# "E eis que lhe trouxeram um paralítico deitado num leito. Vendo-lhe a fé, Jesus disse-lhe: Tem bom ânimo, filho, estão perdoados os teus pecados. Mas alguns escribas murmuravam: Este blasfema.
Jesus, porém, conhecendo-lhes os pensamentos, disse: Por que cogitai o mal nos vossos corações?  Pois qual é mais fácil dizer: Estão perdoados os teus pecados, ou, levanta-te e anda?
Ora, para que saibais que o Filho do homem tem sobre a terra autoridade para perdoar pecados - então disse ao paralítico: Levanta-te, toma o teu leito, e vai para a tua casa. E levantando-se, partiu ele para sua casa" (Mateus 9: 27).

# Tendo Jesus ouvido o que diziam os fariseus, disse-lhes: Os sãos não precisam de médico, sim, os doentes; ide, porém, e aprendei o que significa: Misericórdia quero e não sacrifícios; pois não vim chamar justos, e, sim, pecadores" (Mateus 9: 11 - 13).

# "E os seus discípulos lhe perguntaram: Mestre, quem pecou, este mesmo ou seus pais, para que nascesse cego?" (João 9: 2) - referente ao cego de nascença encontrado e curado por Jesus.

       Entende-se por pecado a transgressão de uma lei divina ou de um preceito religioso. Sempre que essa transgressão produza um efeito danoso, que atinja a terceiros ou ao próprio transgressor, causando-lhe prejuízo, perda ou sofrimento de qualquer monta, tem-se, então, a imputação da culpa.
      A culpa pode ser apontada por outrem, nem sempre sendo aceita pelo acusado. Mas pode também ser anotada pelo próprio culpado, que poderá sentir-se na obrigação de reparar o erro, ou quedar em sofrimento profundo, autoflagelando-se, ao fixar-se mentalmente na ação praticada, abominando-a e não se perdoando jamais por haver cedido aos maus impulsos.
     A esse tipo de comportamento, que poderá advir imediata ou tardiamente, em relação ao fato, ou aos fatos que o desencadearam, chama-se remorso. E bem se diz que o remorso incendeia e arde como brasa, corroendo a pessoa por dentro.
     Ele ultrapassa o limite do arrependimento, que é simplesmente um reconhecimento, um despertamento da consciência para a percepção do mal praticado e o desejo instantâneo de repará-lo, de alguma maneira. Dá-se-nos o remorso quando enxergamos a falta e as consequências imprevistas da mesma, mas não visualizamos nenhuma possibilidade de revertimento da situação gerada, o que leva a nos condoermos daquele que foi atingido, de modo que passamos, então, a punir-nos severamente, ainda que só pelo pensamento, como se quiséssemos e pudéssemos tomar o seu lugar e sofrer na mesma medida que julgamos tê-lo feito sofrer.
      Antes de chegarmos até o remorso, no entanto, podemos passar por outros estágios de identificação do mal ou dos males por nós praticados. Um deles é o medo e a sensação de que somos perseguidos por acusadores vingativos e impiedosos, que nos desejam destruir, pagando-lhes em dobro, mal com mal, tudo que a eles causamos em vida. Isto ocorre conosco ainda vivos, quando somos obsediados pelos que prejudicamos e levamos à morte, ou depois de desencarnados, em que os Espíritos das trevas se acercam de nós para nos levarem a uma espécie de loucura, dado o mal que lhes fizemos e o ódio que guardaram de nós. Pode ser também um estágio de alucinações, vindo da nossa própria mente culpada, quando os que nos sofreram os danos sequer nutrem qualquer sentimento de vingança, uma vez que estão em outra dimensão superior da Espiritualidade. É a auto-condenação. Há, ainda, nesses casos, o medo e a fuga da punição, que pode induzir-nos a um falso arrependimento.
     Seguindo, muitas vezes, por esse caminho, pelos escombros mentais plasmados pelo sentimento de culpa, chega-se, mais hoje ou mais amanhã, a um estágio de verificação consciente de todo o mal praticado e, por conseguinte, ao verdadeiro arrependimento. Nesse momento vislumbramos a possibilidade e, por sugestão do nosso mentor espiritual, algumas formas de compensarmos os nossos equívocos.
     A regra áurea, pronunciada por Jesus, é esta: "Tudo quanto quereis que os outros vos façam, assim fazei-o vós também a eles" (Mateus 7: 12).
     O apóstolo Pedro, inspiradamente, assim dirá aos primitivos cristãos e a nós: "Acima de tudo, tende amor uns para com os outros, porque o amor cobre multidão de pecados" (I Pedro 4: 8). Ora, senhores, a vida é tão breve no seu sentido geral, sendo ainda mais breve para uns do que para outros, que, na prática, poucos de nós teríamos chances reais de repararmos os nossos erros (pecados) cometidos ao longo da maior parte de nossa vida, caso não houvesse reencarnação, ou seja, o retorno do mesmo espírito em outro corpo carnal à terra, onde, segundo os Espíritos instrutores, expiamos os faltas pregressas, resgatando nossas dívidas para com as leis infringidas. Nesse sentido, sim, somos todos pecadores, isto é, todos devedores. Por isto é que uns de nós entramos na nova existência física cegos (veja a passagem do cego de nascença), paralíticos, aleijados e problemáticos de toda sorte. ///

NOTA: Por se tratar de assunto tão abrangente, nosso comentário, em resposta às perguntas acima formuladas, continuará no texto seguinte (de nº 28).

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