segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

86. A GÊNESE: O CASTIGO PERPÉTUO

       P. Moisés fala do castigo imposto por Deus a Adão e Eva por terem desobedecido sua ordem para que não comessem do fruto da árvore que havia no centro do Éden. O que diz o Espiritismo sobre tal castigo?

       R. Mais uma vez, com "A Gênese" de Allan Kardec, em seu capítulo XII, podemos analisar essa descrição bíblica sob uma ótica diferente da que se costuma fazer nas religiões e crenças tradicionais, conforme a palavra do codificador, que passo a transcrever:
       {"Se a falta de Adão foi literalmente o ter comido uma fruta, incontestavelmente, ela não poderia, por sua natureza pueril, justificar o rigor com que foi ele castigado. Não se poderia, não mais racionalmente, entender que esse erro se relacione  com o fato que se supõe geralmente; de outro modo, considerando-o como um crime irremissível, Deus condenaria a sua própria obra, uma vez que criara o homem para a propagação da própria espécie (por meio de uma lei natural: de reprodução). Se Adão houvesse entendido nesse sentido a proibição de tocar o fruto da árvore e se conformasse com isto, escrupulosamente, onde estaria a Humanidade, e que seria então dos desígnios do Criador?
       Deus não criou Adão e Eva para permanecerem sozinhos sobre a Terra; e a prova disso está nas próprias palavras que lhes dirigiu imediatamente depois de sua criação, quando ainda estavam no Paraíso terrestre: 'Deus os abençoou e disse: Crescei e multiplicai-vos; enchei a Terra e sujeitai-a' (Gên. 1: 28). Uma vez que a multiplicação do homem era uma lei desde o paraíso (e nada faz crer que o próprio Deus criaria novos homens do lodo da terra e de uma costela de cada um deles uma nova mulher), a sua expulsão do jardim não poderia ter por causa o fato suposto.
         O que dá crédito a essa suposição é o sentimento de vergonha de que Adão e Eva foram tomados diante de Deus (a percepção de sua própria nudez), e que os levou a se esconderem. Mas essa mesma vergonha é uma figura por comparação: ela simboliza a confusão que todo culpado sente em presença daquele a quem ofendeu (item 19).
       Qual é, pois, definitivamente, essa falta tão grande que pôde atingir com a reprovação perpétua a todos os  descendentes daquele que a cometeu? Caim, o fratricida, não foi tratado com tanta severidade. Nenhum teólogo pôde defini-la logicamente, porque todos, não desviando os olhos da letra, giraram num círculo vicioso" (item 20).} 
      O pecado de Adão provocou a morte do homem por todas as gerações procedentes; Ora, quando dizem que Jesus foi enviado para livrá-lo da morte, há que se perguntar: por que, então, a morte não foi cancelada desde a sua vinda, pelo menos para os que o aceitaram, já que também se coloca essa aceitação como condição para a salvação humana? Posto que até os salvos diretamente pela mão de Jesus vieram a morrer, e morre-se até hoje, sem que ninguém escape a esta operação da Natureza, então é porque a morte não foi dada ao homem como castigo do pecado original de Adão e Eva, como reza a tradição religiosa.
       {"Hoje entendemos que essa falta não foi um ato isolado, pessoal, de apenas um indivíduo, mas que ela compreende, sob um fato alegórico único, o conjunto das prevaricações das quais tornou-se culpada a humanidade ainda imperfeita da Terra, e que se resumem nestas palavras: infração às leis divinas. Eis porque a falta do primeiro homem, que é o símbolo da Humanidade em seus primeiros passos rumo à evolução coletiva, foi simbolizada, ela mesma, por um ato de desobediência (item 20).
       Dizendo a Adão que ele tiraria o seu alimento da terra com o suor do seu rosto, Deus, simbolicamente, determina ao homem a obrigação do trabalho; mas por que se faz do trabalho uma punição? Que seria da inteligência do homem se ela não se desenvolvesse pelo trabalho? Que seria a terra, se ela não fosse fecundada, transformada, saneada pelo trabalho inteligente do homem?
       (...) Por que Deus disse à mulher que, por causa da falta que ela cometeu, parirá na dor? Como pode a dor do parto ser um castigo divino, posto estar comprovado fisiologicamente ser ela necessária? (Isto, bem compreendido, no parto normal, natural). Como uma coisa que está segundo as leis da Natureza pode ser uma punição? É o que os teólogos não puderam ainda explicar, e o que não poderão fazê-lo enquanto não saírem do ponto de vista em que se colocaram; e, entretanto, essas palavras aparentemente contraditórias, podem ser justificadas" (item 21).}
       Tanto o suor do rosto de Adão, quanto o parto com dor de Eva, são emblemas das condições da Terra para aquelas almas que migraram de uma esfera mais adiantada, onde já não se necessitava da força braçal para o cultivo do alimento e onde a tecnologia eximia da parturiente a dor do parto normal, tal como ocorre no atual estágio da Terra, cada vez mais intelectualizada e tecnologicamente avançada.
       {"Notemos, primeiro, que se, no momento da criação de Adão e Eva, suas almas fossem tiradas do nada, como se ensina, deveriam ser noviças e ignorantes de todas as coisas; não deveriam saber o que é morrer. Uma vez que estavam a sós na Terra, enquanto viveram no paraíso terrestre, não viram ninguém morrer; como, pois, compreenderiam a ameaça de morte que Deus lhes fazia? Como Eva poderia compreender que parir na dor seria uma punição, uma vez que, recém criada para a vida, nunca ainda tivera filhos, e que era a única mulher no mundo? As palavras de Deus, portanto, não poderiam ter para eles nenhum sentido. Tirados do nada, como por encanto, não deveriam saber nem porquê e nem como dele saíram; não deveriam compreender nem o Criador e nem o objetivo da proibição que lhes fazia. Sem nenhuma experiência das condições de vida, como crianças que agem sem discernimento, pecaram, e isto torna mais incompreensível ainda a terrível responsabilidade que Deus fez pesar sobre eles e sobre toda a sua descendência, a saber: a Humanidade inteira" (item 22).}
       Temos aqui, pois, mais um bom motivo para não nos prendermos mais à letra morta, buscando o espírito que vivifica, no que está registrado nas Escrituras, racionalizando sobre o sentido alegórico das palavras, para daí tirarmos o verdadeiro sentido das advertências que nos vêm do Alto, para a nossa evolução espiritual, que é o que realmente deve nos importar. ///

Nota: Este texto é uma sequência dos textos de nºs. 81, 82, 83, 84 e 85, seus precedentes.

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